domingo, 19 de agosto de 2007

Manifesto pelo 6o Congresso da Abraço Nacional


Introdução: expomos abaixo a memória e a decisão tomada pela Coordenação Estadual, em reunião ocorrida em fevereiro de 2007, quando a Abraço-RS se anifestou pela convocatória do 6o Congresso Nacional de nossa entidade. O texto que segue, é datado de março de 2007, cerca de 45 dias antes da ocupação da rádio do Melão, representante formal da quadrilha da família Sirotsky. Boa leitura.


Manifesto pelo 6o Congresso da Abraço Nacional - março de 2007



É chegada a hora. A causa da radiodifusão comunitária está numa encruzilhada. Ou avançamos para uma postura de movimento popular ou ficaremos embretados entre desconfianças, atrelamento com um governo controlado pelo sistema financeiro, os partidos tradicionais e as multinacionais, com uma política repressora contra a mídia comunitária e escanteados da briga do oligopólio com as empresas de telecomunicações. No fundo, o problema é de concepção. Ou seja, da forma como vemos a causa da democracia plena da comunicação social no Brasil. É difícil forjar a unidade que tanto precisamos, mas é impossível fazer esta unidade fora da luta direta.

Construir a concepção de movimento

Desde a Assembléia Constituinte (1987-1988) que viemos tentando fazer as coisas por dentro, com grupos de pressão, lobbies, bancadas de parlamentares amigos, e nada disso vem funcionando como deveria. Não devemos nem podemos abandonar os espaços institucionais, mas estes são secundários, tem de estar em segundo plano. Prioritário é lutar e organizar. A luta e a formação dos comunicadores populares deve ser nossa prioridade. Militando com firmeza, enfrentando a patronal, os radiodifusores. Nos últimos 20 anos, a maior parte da massa crítica não está na ponta, pendurando antena, correndo com o transmissor nas costas, dando de cara com a Polícia Federal e batendo de frente com a Anatel. Infelizmente, estas cabeças pensantes têm mãos ágeis apenas para formular políticas e discursos.

Basta! As rádios e TVs comunitárias precisam de militantes, gente que formule e execute, comunicadores que metam a mão, pluguem fios, operem uma mesa de som, falem ao microfone, animem um baile popular e ajam com a mesma desenvoltura que cortam uma rua e ocupam um edifício. Com vontade de se forjarem como referências, construir a Abraço na base, na rua, no pau e no barro.

Sabemos das carências de nosso povo, e conhecemos todas as suas virtudes. Mas, com ou sem a formação política necessária, estes são os lutadores populares, filhos e filhas da classe que aprenderam a fazer rádio na marra, e agora se aventuram pela TV e a internet. Gente que muitas vezes mora na própria emissora, vive na casinha do lado, luta para sobreviver, rala 12 horas por dia, peleando de domingo a domingo para democratizar o que é nosso por direito.

Temos várias perguntas e algumas certezas. Uma delas é que fora da luta, tudo é ilusão. Sem o povo organizado, é só proselitismo. Sem estrutura, nossas entidades são castelos de areia. Sem vontade política de agir, seremos vítimas e não protagonistas de nosso próprio destino.

Com tanta vontade, falta é nos juntarmos outra vez para refundar o movimento brasileiro de radiodifusão comunitária. Assim, com a pessoa jurídica da Abraço, mas com a garra e coragem de quem pratica a desobediência civil todos os dias, retomaremos a ponta da lança da luta pela democracia na comunicação.

Quem são os militantes da radiodifusão comunitária? Qual o modelo de comunicação que queremos? Quais são nossos aliados? Que estrutura precisamos para resistir e avançar no projeto político e popular de comunicação?

Daqui do Rio Grande convidamos todas as estaduais para este debate, para chegarmos juntos nos mesmos caminhos necessários. A mais longa das travessias começa com o primeiro passo. Para isso precisamos de um congresso. Um espaço onde, com toda a tranquilidade e reflexão, seja possível transformar em política nosso saber e prática acumulados em mais de 20 anos de luta.

Quem samba fica

A proposta é simples. O movimento de radiodifusão comunitária chegou a um limite. Diante de um suposto governo amigo, sofremos a pior repressão em democracia. Em 2006, somente no Rio Grande do Sul, foram 244 emissoras apreendidas, lacradas, equipamentos roubados, militantes presos e processados. Uma emissora a cada 2 dias foi fechada. E estes dados são da própria Anatel. Não podemos nos calar nem seguir na ilusão da "política de bastidores" como solução para alguma coisa. Fazer polititica de corredor não é, não será e nem nunca foi a saída para os oprimidos.

Em nível nacional a coisa vai igual ou pior. Tivemos mais de 2000 emissoras comunitárias reprimidas nos últimos 4 anos. A causa da digitalização democrática foi vergonhosamente derrotada por uma política entreguista. Primeiro essa gente chorou na tumba de Roberto Marinho. Depois se aliou na cara de pau com a Globo, emissora-símbolo da ditadura militar e da mídia mentirosa. Até quando vamos aturar esse tipo de coisa? Nenhum contrato da "privataria" do Sistema Telebrás foi revisto. Nenhum! Enquanto Bolívia, Venezuela e Equador retomam na marra o patrimônio popular, os ativistas brasileiros assistem ao entreguismo da TV Digital.

Até que ponto irá nossa passividade? Ou será que alguém pensa que apenas trocando emails e fazendo encontros vamos conseguir reverter este processo? Ao menos a luta pela TV Digital chegou a se tornar pública, ao contrário dos testes ilegais do Sistema IBOC. Este padrão gringo, de altíssimo custo, vai digitalizar a transmissão das rádios. Com a fabricação dos rádios receptores apenas no formato digital, a tendência é de nossas rádios comunitárias correrem o risco de desaparecer com o tempo. Isto porque, em 10 anos, os ouvintes não vão ter em suas casas rádios que captem as programações. Fica a dúvida. Vamos aceitar isso passivamente, cruzando o campo como tropa de boi indo para o abate?

Luta e Organização! Radicalidade, democracia interna e compromisso militante!

Chamamos a militância da Abraço para um congresso simples, um espaço de debate político. Entendemos a necessidade de fazer a instância em um ambiente tranqüilo, concentrados nas discussões e buscando rumos para a entidade. Nestes dias, aplicar todo o tempo e concentração para lançarmos as linhas políticas do movimento. Assim, as questões da pessoa jurídica devem ser secundárias.

Para evitar problemas, a proposta também é direta. Transparência total, prestação de contas de tudo e de todos, e os projetos que entrarem devem estar subordinados a decisão política e após, encaminhados pela coordenação democraticamente eleita. Entendemos que a radicalidade caminha junto de uma postura não-sectária, de independência em relação a partido, governo e financiadores, plena de democracia interna. Que nossas pessoas jurídicas sejam apenas a cara legal do movimento, e nada mais.

Temos várias metas a cumprir, dentre elas: ir além da Lei 9612/98, lutar pela digitalização democrática, defender a indústria nacional de telecomunicações e semi-condutores apoiando a luta destes trabalhadores pela manutenção de seus postos de trabalho, criar um campo de alianças junto aos sindicatos de jornalistas e radialistas (fortalecendo uma concepção de sindicalismo onde patrão não entre e nem fale em nome da categoria), brigar por verbas públicas para a radiodifusão comunitária, pelo fim do patrocínio oficial para a mídia burguesa e as teles da privataria, pela anistia total dos processos contra as RadComs, contra a repressão do Gangstério das Comunicações, Anatel e Polícia Federal.

Além das lutas de resistência e reivindicativa, temos de construir e formalizar nosso modelo de comunicação democrática. Para isso, é preciso gerar e formular um consenso básico na formação política, técnica e de oficio de nossos comunicadores populares. Com capacitação e vontade política tudo o resto é conseqüência.

Para marcar este perfil de congresso, sugerimos que o mesmo fique longe de Brasília e seus gabinetes, ministérios e palácios. Defendemos a realização do Congresso em Minas Gerais, para marcar posição com o inimigo, ministro Hélio Costa, e respaldar e reconhecer os méritos dos lutadores que tanto fizeram por nossa causa, a começar pela Rádio Favela FM. Em especial, Minas Gerais foi o pólo gerador de uma tecnologia nacional de ponta. O chamado “Vale do Silício tupiniquim”, na cidade de Santa Rita do Sapucaí, marcam mais de 40 anos de empenho em gerar uma indústria brasileira de alta qualidade. Todos estes trabalhadores estão em perigo, porque nosso parque industrial pode passar a ser apenas uma montadora de peças vindas de fora. Para marcar nosso repúdio a esta política entreguista e vende-pátria, entendemos que fortaleceremos a defesa de nossa cadeia produtiva de transistores, condutores e semi-condutores, realizando o Congresso em Minas e criando um fato político no Sul das Gerais.

O que propomos

Queremos um congresso militante, feito por lutadores, rico no debate, com estrutura simples e prática. Entendemos que isso é urgente e estamos dispostos a construir a instância nacional. Convidamos a todas as estaduais, ativistas e militantes da radiodifusão comunitária a compor esta caminhada e partir para esta outra etapa da luta pela democracia real na comunicação social no Brasil.


Ocupar, resistir, transmitir! Sempre!
Solidariamente, Coordenação Estadual da Abraço RS

COM HUMILDADE NOS DESPEDIMOS. TEMOS A CERTEZA DE QUE OS MILITANTES QUE NÃO TEM MAIS TEMPO PARA TEREM MEDO VÃO COMPREENDER O SENTIDO DESTAS TOSCAS PALAVRAS ACIMA!

PORQUE SÓ A LUTA DECIDE!

PORQUE SOMENTE O POVO EM MARCHA TRAÇA SEU CAMINHO!

PORQUE O POVO TEM VOZ!

PORQUE FAZEMOS DESOBEDIÊNCIA CIVIL E COMUNICAÇÃO POPULAR TODOS OS DIAS!

PORQUE RADIODIFUSÃO COMUNITÁRIA É ANTENA NO AR, O BAIRRO FALANDO E O POVO EM MARCHA!

PORQUE NOSSA CLASSE MERECE UMA ABRAÇO LUTADORA!

TODOS AO 6º CONGRESSO!

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